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A dialética do desconfinamento

Blog escrito pelos psicólogos da Psinove. Exploramos temas relacionados com a psicologia e psicoterapia, desafios e reflexões do dia-a-dia.

A dialética do desconfinamento

A recente medida de confinamento que todos temos vivido, fruto da pandemia causada pelo novo vírus SARS-COV2, levou-nos a experimentar um conjunto de emoções e sentimentos complexos que com certeza encontrariam uma menor presença na nossa rotina se se tivesse mantido inalterada.

Têm sido amplamente faladas as múltiplas dificuldades que o confinamento pode conter: o isolamento, o medo, a gestão familiar, a quebra de rendimentos, entre muitos outros. Na prática, existem uma multiplicidade de reações a esta situação: existem muitas pessoas em sofrimento pela privação de contacto com a sua rede social (que é também familiar) mais próxima, pessoas que se sentem confortáveis com o contacto mediado pela tecnologia, pessoas a contar os dias para voltar ao emprego, pessoas que estão a gostar de trabalhar em casa, pessoas que já não suportam ecrãs, pessoas que perceberam que suportam ecrãs, pessoas céticas e pessoas otimistas.

Fazendo aqui uma breve pausa, a introdução do conceito filosófico de dialética é de extrema importância. A dialética um método de diálogo cujo foco é a contraposição e contradição de ideias que levam a outras ideias. A tradução literal de dialética significa "caminho entre as ideias".

Tendo em conta a diversidade de reações que a fase de confinamento fez despontar, é de prever que a fase de desconfinamento também seja um processo que deve ser refletido. Com alguma complexidade extra, pois a segurança individual estará dependente de um comportamento de grupo, que por sua vez estará sujeito às experiências, interpretações e crenças de cada uma das pessoas integrantes desse grupo. Se, por um lado, temos (e ainda bem!) de sair da zona de segurança que criámos nas últimas semanas, também temos de conseguir manter (e ainda bem!) comportamentos responsáveis de contenção e distanciamento físico. Se, por um lado, podemos voltar a sair de casa, também temos de pensar em como o vamos fazer, porque a normalidade anterior é diferente das várias aproximações à normalidade que temos de ir fazendo. Se, por um lado, conseguimos viver estas semanas, com uma sensação de controlo e segurança contra todos os males do exterior, também temos de voltar a sentir-nos seguros em espaços mais alargados, readquirindo (pelo menos) algum do bem-estar e naturalidade. Se, por um lado, o mundo à nossa volta vai começar a funcionar de forma mais abrangente, também alguns de nós terão de continuar mais protegidos, ou confinados, por mais algum tempo (como é o caso da população mais idosa, dos doentes de risco, dos pais com crianças a ter aulas em casa...).

Nada do que poderá acontecer, do que vai acontecer, tem apenas um sentido. É fundamental que consigamos pensar nesta dialética, neste caminho entre ideias, para conseguirmos ser resilientes, para conseguirmos fazer o que tem de ser feito, para conseguirmos correr riscos e para conseguirmos manter-nos em segurança. Não vai ser fácil conseguir perceber todos os limites e autorizações inerentes a esta nova fase. Não vai ser fácil conseguirmos ter sempre presente o que temos de fazer, quando o que queremos fazer pode puxar-nos para um dos lados do caminho. Por isso, esta reflexão merece o nosso tempo. Para que estejamos conscientes que este é um caminho que tem de dialogar com várias ideias.

Para que o futuro também seja mais um processo e menos uma meta.

Se tensões, conflitos e dilemas irremediáveis são o tempero de todas as culturas, um ser humano pertencente a qualquer cultura específica deve ter crenças contraditórias e ser dilacerado por valores incompatíveis. É uma característica tão essencial a qualquer cultura que até recebeu um nome: dissonância cognitiva. A dissonância cognitiva é, com frequência, considerada uma falha da psique humana. Na verdade, trata-se de uma qualidade vital. Se as pessoas não fossem capazes de ter crenças e valores contraditórios, provavelmente seria impossível construir e manter qualquer cultura humana.

In Sapiens, Y.N.Harari, 2011


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