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Gosto de alguém com personalidade borderline... e é a minha mãe

Blog escrito pelos psicólogos da Psinove. Exploramos temas relacionados com a psicologia e psicoterapia, desafios e reflexões do dia-a-dia.

Gosto de alguém com personalidade borderline... e é a minha mãe

“Durante muitos anos aprendi a não contrariar a minha mãe quando está de mau humor – especialmente se esteve a beber. Torna-se argumentativa por assuntos sem importância e tenta atribuir tudo a mim. Eu nunca digo nada, porque o que quer que diga, está sempre tudo errado. Se ela me pergunta algo, eu digo apenas “Não sei”. Apesar de ter trinta e três anos, lembro-me do dia em que descobri que podia simplesmente responder “Não sei” (tinha onze anos) e que isso resultava para que se calasse. Naquela altura, achava que todas as mães agiam assim.”

Gail, in Stop walking on eggshells workbook

Crescer com um pai ou uma mãe com Perturbação de Personalidade Borderline causará, quase indubitavelmente, algumas especificidades, por exemplo, na forma como se constroem as relações e na confiança ou tranquilidade com que se encara o mundo.

Nas fases mais precoces da vida dos indivíduos, as necessidades mais preponderantes são as necessidades fisiológicas e as de segurança. A consistência e o afecto seguro são as formas mais universais de transmitir essa segurança. Quando o pai ou a mãe experienciam dificuldades nessas dimensões, é natural que os filhos cresçam com um conjunto de necessidades por satisfazer ou explorar. Obviamente que nada disto é excessivamente determinista e, felizmente, as relações podem ser reinventadas a qualquer fase da nossa vida, bastando para isso, que haja disponibilidade de ambas as partes.

No entanto, é inegável que crescer no seio de uma família em que um dos progenitores, e por vezes os dois, enfrentam a problemática da personalidade borderline comporta consequências para os seus elementos em crescimento.

Como já tem sido dito em textos anteriores, o espectro da personalidade borderline é lato e poderá ter uma gravidade muito variável. Desde simples traços ou características que perturbam pontualmente o quotidiano, a situações com uma intensidade que condiciona amplamente o dia a dia, com consequências nefastas para os que com eles vivem nesse turbilhão. Os filhos desenvolvem frequentemente uma sensação de “sempre alerta”, de invisibilidade, numa tentativa frenética de evitar o conflito, o confronto, de forma a não iniciar uma nova crise. Podem ter de lidar com dificuldade em estabelecer relações de confiança com os outros, em construir uma adequada auto-estima, em sentirem-se suficientemente seguros nas relações próximas.

Continuar a lidar com pais com perturbação de personalidade borderline pode querer dizer fazer o luto daquilo que não se teve e conseguir estabelecer limites novos e adequados em relação a eles. Pode querer dizer que se tem que repensar os limites da relação com os pais e das relações em geral, reposicionando-os. E pode também significar uma aceitação dos pais que se teve, disponibilizando a ajuda e a compaixão.

Viver próximo de alguém com perturbação de personalidade borderline gera, com maior frequência e intensidade, sentimentos negativos ou zanga. Entrar em contacto com estas emoções e ganhar clareza sobre elas é um passo importante para viver melhor.

Tal como acontece frequentemente quando, numa família, há um filho com este problema, também o ter um pai ou mãe com esta perturbação de personalidade pode, facilmente, fazer com que a família entre numa espiral de desespero em relação ao problema. É muito frequente que alguns filhos tenham dificuldade em autonomizar-se dos pais por sentirem que esse movimento trará muita desestabilização a um pequeno sistema já muito massacrado. Pode parecer que é melhor permanecer do que sair, tornando-se a família de origem numa espécie de prisão, de onde só se sai a alto custo.

Sabe-se que partilhar a experiência com outras pessoas que passaram por situações semelhantes traz um grande alívio aos familiares. Faz com que as pessoas não se sintam sozinhas, que sintam que as suas experiências são compreensíveis e que existem mais pessoas a passar por coisas semelhantes. Não existem muitos (se é que existe algum!) grupos organizados de partilha de pessoas com pais ou familiares com perturbação de personalidade borderline, em Portugal. Na sua ausência, os amigos chegados ou os grupos online podem ser boas formas de partilhar as dificuldades por que estão a passar.


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