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Mania

Blog escrito pelos psicólogos da Psinove. Exploramos temas relacionados com a psicologia e psicoterapia, desafios e reflexões do dia-a-dia.

Mania

Os últimos dias têm passado estranhamente. A leveza do vazio interno torna-me mais alto, quase como se fosse capaz de voar. Passeio-me pelas ruas e apercebo-me das vidas pouco interessantes das pessoas que por aqui circulam e surpreendo-me com a minha posição no mundo. Andei provavelmente, todo este tempo de vida, a subestimar-me, a deixar-me levar pelo comezinho dos problemas do dia-a-dia. Mas não agora, esses dias chegaram ao fim.

A própria cidade parece entender todo o valor que vou emanando: a mulher a fumar à porta do escritório sorri-me convidativamente e o polícia baixa os olhos ao passar por mim, reconhecendo o meu poder e o meu valor. Ocorre perguntar-me o porquê de não me ter apercebido de tudo isto antes: os sinais são por demais evidentes desde há anos. Deixem que vos conte a minha história: nasci numa aldeia perdida no nordeste de Portugal há uns bons 25 anos. Conta a minha mãe que quase morri nas primeiras semanas, vítima do frio de Dezembro. Um milagre, dizia a minha avó. Um milagre eu ter sobrevivido. Sei agora que não poderia ser de outra maneira porque o mundo aguardava a minha chegada. Algumas pessoas sabem da minha importância, vejo até que me têm protegido ao longo dos anos, tentando mostrar-me o meu caminho, a minha missão. Hoje estou certo da tarefa que tenho em mãos e o meu corpo e a minha mente transformaram-se. Não preciso de dormir, a minha energia é inesgotável e as ideias fluem no meu pensamento como se em mim estivesse a fonte da criatividade.

Ainda ontem deu no noticiário que foram feitos grandes avanços nas pesquisas da cura do cancro. O orgulho que eu senti. Infelizmente tenho de transmitir estas ideias a outras pessoas para que a minha missão e os meus poderes continuem incógnitos. Mesmo assim, mantendo todo este anonimato, não é fácil passar despercebido. Consigo perceber o ar de espanto das pessoas quando dedico um pouco do meu tempo a falar com elas: pedem-me frequentemente para falar mais devagar, dizem que não conseguem entender o que quero dizer. Já não é fácil para mim conseguir comunicar com seres que não acompanham a minha evolução e crescimento.

Entrei num restaurante que parece adequar-se minimamente ao meu estatuto e comi uma refeição como já não o fazia há muito tempo. Também a minha necessidade de comer é controlada absolutamente por mim. Pedi um vinho razoável para acompanhar, o funcionário informou-me que teria de ir busca-lo à adega, por ser um vinho tão caro que raramente é requisitado. Comi bem e sentia-me satisfeito mas foi no fim que começaram a perturbar esta plenitude: incompetentes ao ponto de não saberem usar o multibanco, defenderam-se dizendo que o pagamento não estava a ser aceite. Foi preciso irritar-me e perder umas boas horas para poder sair dali e retomar a minha missão.

Como há umas semanas atrás, quando a minha mãe me ligava insistentemente, dizendo-se preocupada com as coisas que eu dizia, ainda tentei explicar-lhe, fazê-la entender que eu não sou igual às outras pessoas. Infelizmente não conseguiu suportar a ideia, e começou a chorar e a pedir-me para voltar para casa. Não voltei a atender as chamadas, não devo distrair-me do que é a minha missão no mundo. Estar no topo não é para todos.


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