Ansiedade
O que é?
A ansiedade é uma reação natural que todas as pessoas experienciam em algum momento da sua vida. Quando antecipamos situações de incerteza ou perigo, o corpo e o cérebro desencadeiam um mecanismo de luta, fuga ou bloqueio que está associado à ansiedade. Isto é, falamos de um mecanismo de adaptação ao meio e sobrevivência. Muitas pessoas sentem ansiedade quando enfrentam um problema no trabalho ou momentos antes de fazer um teste ou tomar uma decisão importante. Quando em níveis moderados, a ansiedade pode ajudar-nos a lidar melhor com estes desafios, mobilizando-nos para que consigamos responder-lhes. No entanto, por vezes esta ansiedade pode ser tão intensa que interfere com o normal funcionamento da pessoa. Em geral, a emoção que está na base da ansiedade é o medo e este pode ser muito bloqueador e paralisante.
A ansiedade transforma-se numa perturbação psicológica quando é tão intensa, frequente e duradoura que interfere com a capacidade das pessoas para lidar com situações normais do seu quotidiano a nível pessoal, familiar, social e profissional e satisfazer as suas necessidades psicológicas e fisiológicas.
Quais os principais sinais e sintomas?
Se apresenta vários sintomas e a sua frequência, intensidade e/ou duração são elevadas, é possível que tenha ou esteja a desenvolver uma Perturbação de Ansiedade. Os sinais desta condição podem expressar-se ao nível de diferentes domínios:
1) Domínio Comportamental e Cognitivo:
- Perceção de que está em perigo constante;
- Comportamentos de evitamento de situações com que normalmente conseguiria lidar;
- Isolamento social;
- Pensamentos negativos ligados ao fracasso e a si próprio/a;
- Preocupação excessiva e/ou constante consigo, com os outros e/ou com o futuro;
- Padrões de sono alterados que podem gerar insónia frequente e/ou pesadelos.
2) Domínio Emocional
- Medo intenso ou persistente em várias situações de vida;
- Irritabilidade constante como se estivesse a “implodir”;
- Sentir uma mistura de emoções não expressas e que podem ser contraditórias.
3) Domínio Físico
- Tensão muscular e/ou dores musculares e propensão para lesões;
- Fadiga constante;
- Dificuldades em respirar e sensação de falta de ar;
- Suores frios;
- Tonturas;
- Batimentos cardíacos acelerados;
- Dores de cabeça frequentes e inexplicáveis;
- Náuseas e/ou vómitos.
Que tipos existem?
As Perturbações de Ansiedade partilham entre si alguns sinais e sintomas centrais, mas podem distinguir-se em função do tipo de situações indutoras de medo/comportamentos de evitamento e das crenças e pensamentos associados. Alguns dos tipos de Perturbação de Ansiedade tendem a ocorrer em simultâneo.
Ansiedade de Separação - Sensação de medo ou ansiedade quando se prevê o afastamento de pessoas significativas. Esta antecipação envolve também o medo de que ocorra algo de doloroso ou catastrófico com o afastamento, sentindo que não se consegue cuidar de si mesmo nessas circunstâncias. A Ansiedade de Separação tipicamente envolve alguma forma de resistência ao afastamento das pessoas significativas.
Mutismo Seletivo - Perturbação caracterizada por uma incapacidade consistente em falar em determinadas situações sociais, mesmo que o indivíduo não apresente qualquer dificuldade em falar noutras situações. Esta incapacidade apresenta consequências significativas no desempenho académico, profissional e/ou social.
Ansiedade de Desempenho - Receio de não estar à altura de determinados desafios, tendo elevados padrões de autoexigência e não conseguindo valorizar cada sucesso por sentir que podia ter sido melhor. Pode estar presente nos papéis familiares, profissionais e sociais e até no lazer. Este tipo de ansiedade surge muito ligado a padrões de perfeccionismo, conduzindo a uma frequente zanga da pessoa consigo mesma de cada vez que não atinge o que antecipou. A Ansiedade de Desempenho surge também ligada ao medo de se desiludir os outros e de ser visto como fraco, incapaz ou sem recursos.
Fobias Específicas - Aparecimento imediato de uma intensa ansiedade e pavor face a uma situação, objeto ou estímulo específico (por exemplo, um animal). Estes são constantemente evitados ou encarados com um grande medo irracional que é exagerado tanto para o risco que a situação comporta como para o contexto sociocultural da pessoa. Ao contrário de várias das outras Perturbações de Ansiedade, este tipo não está associado a cognições, sendo o medo e evitamento automaticamente induzidos pela situação fóbica.
Ansiedade Social - Ansiedade e evitamento de situações sociais que envolvam a possibilidade ou antecipação de crítica, observação ou escrutínio por parte de terceiros, principalmente desconhecidos. São também incluídas situações em que a pessoa tenha de desempenhar funções sobre as quais não está segura, como falar em público; ou situações que noutros contextos a pessoa desempenha confortavelmente, como comer ou beber. Nestas, existe medo de ser avaliado negativamente pelos outros e de sentir embaraço, humilhação ou rejeição.
Perturbação de Pânico - Ao passo que a ansiedade envolve a antecipação de uma ameaça futura, o pânico consiste num tipo de resposta particular de medo a uma ameaça percebida como imediata. Estas reações são sentidas de forma extrema e incontrolável, podendo ser inesperadas e recorrentes. A partir do momento em que a pessoa tem o primeiro ataque de pânico, passa a pensar: “E se tiver um ataque de pânico? E se me sentir mal?”. Este processo, chamado cogitação, é um motor de arranque para novos episódios de pânico, vivendo-se constantemente com receio e a monitorizar todos os sinais fisiológicos, como se o indivíduo vivesse com o permanente medo de morrer devido à intensidade de cada episódio. Os ataques de pânico são originados por emoções não expressas ou sem consciência, ligadas, por exemplo, a “assuntos inacabados” com pessoas importantes e acontecimentos marcantes de vida. Está envolvida uma parte do nosso Sistema Nervoso chamada Sistema Nervoso Simpático, responsável por desencadear respostas que mobilizam o organismo para se proteger em situações de perigo percebido. Ocorrem geralmente em repouso e levam a que a pessoa comece a evitar locais como centros comerciais, pontes, concertos, andar de transportes como metro, avião, automóvel ou autocarro - situações em que se sente não ter escapatória.
Agorafobia - Esta condição pode apresentar-se ou não conjugada com a Perturbação de Pânico. Pessoas com Agorafobia sentem medo e/ou Ansiedade intensos em duas ou mais das seguintes situações: usar transportes públicos; estar em espaços abertos/ao ar livre; estar em locais muito pequenos ou com muita gente; estar em filas ou no meio da multidão; estar fora de casa, só, em situações diversas. Existe a antecipação do embaraço sentido ou de que as outras pessoas percebam os seus sinais de ansiedade, causando ainda mais desconforto. A este fenómeno chama-se “ansiedade de segunda ordem”: ficar-se ansioso por se reparar que se está ansioso. Muitas vezes, estas pessoas precisam de estar constantemente na companhia de alguém em quem confiem para fazer tarefas que outras pessoas fariam sozinhas.
Perturbação de Ansiedade Generalizada (PAG) - Os sinais e sintomas desta condição passam por uma ansiedade e preocupação persistentes e excessivas acerca de vários domínios. Adultos com PAG tipicamente preocupam-se com temas relacionados com a vida quotidiana, rotinas diárias, responsabilidades profissionais e domésticas, saúde e finanças. Crianças com PAG tendem a preocupar-se excessivamente com a sua competência e a qualidade do seu desempenho. A intensidade, duração e frequência destes sintomas é desproporcional à probabilidade ou impacto do acontecimento antecipado e durante o curso da perturbação o foco da preocupação pode mudar entre diferentes assuntos. A pessoa sente dificuldade em controlar a preocupação e evitar que interfira com as tarefas que tem em mãos. Adicionalmente, são experienciados sintomas físicos como inquietação, tensão muscular ou nervosismo. Quem apresenta esta condição cansa-se facilmente e tem dificuldade em concentrar-se ou a sua mente fica muitas vezes “em branco”. Podem também surgir sentimentos de grande irritabilidade e perturbações nos padrões habituais de sono, estando a pessoa constantemente em alerta.
Perturbação de Ansiedade induzida por medicação/substância/condição médica - Ansiedade associada a intoxicação por substância, abstinência, tratamento médico ou como consequência fisiológica de outra condição médica.
Quais as possíveis causas e fatores de risco?
Fatores biológicos
No caso de algumas Perturbações de Ansiedade, a herança genética tem um certo peso e foram encontrados alguns marcadores genéticos que provocam uma maior vulnerabilidade a perturbações deste tipo.
Fatores ambientais
Situações ou eventos traumáticos e o abuso de algumas substâncias têm apresentado ligações com o aparecimento de Perturbações de Ansiedade. Ambientes de excessiva proteção, invalidantes ou de abuso (físico e/ou emocional) também se encontram relacionados com o aparecimento de sintomas clínicos de ansiedade. Acontecimentos de vida inesperados e geradores de sofrimento (por exemplo: divórcio, morte de um familiar/amigo, imigração, mudança de residência, acidente, desemprego, parentalidade, entre outras) podem originar Perturbações de Ansiedade.
Qual a prevalência e mortalidade?
A ansiedade acaba por ser transversal a várias faixas etárias, a variados estratos socioeconómicos e géneros. Muitas Perturbações de Ansiedade começam a desenvolver-se nas primeiras etapas de vida. Quando não são alvo de intervenção psicoterapêutica, atempadamente, continuam a desenvolver-se e os episódios e sintomas têm tendência a persistir e aumentar de frequência, intensidade e duração.
Indivíduos que apresentam Perturbações de Ansiedade têm maior probabilidade de experimentar pensamentos sobre suicídio e executar tentativas de suicídio. A Perturbação de Pânico, Perturbação de Ansiedade Generalizada e Fobias Específicas consistem nas Perturbações de Ansiedade que têm mais fortemente sido associadas à transição de pensamentos sobre suicídio para a execução de tentativas.
Como pode a psicoterapia ajudar?
Antes de mais, procurar ajuda não significa que seja fraco ou incapaz, dois rótulos que pessoas com Perturbações de Ansiedade tentam evitar a todo o custo. A ansiedade é um problema internacional de saúde pública que pode conduzir ao suicídio: quanto mais cedo iniciar psicoterapia, mais fácil e rápida será a recuperação. A eficácia da psicoterapia para Perturbações de Ansiedade está cientificamente provada, existindo várias abordagens que podem ajudar nestes casos, incluindo:
- Terapia Cognitivo-comportamental (CBT);
- Terapia Focada nas Emoções (EFT);
- Terapia Existencial;
- Dessensibilização e Reprocessamento por Movimentos Oculares (EMDR), quando existem situações traumáticas associadas;
- Mindfulness.
Desde o primeiro momento, ir-lhe-á ser ilustrado o funcionamento da ansiedade, para que seja depois mais fácil regular todas as emoções, pensamentos e comportamentos a ela associados. Pode trabalhar-se a identificação dos “gatilhos” que geram ansiedade e a aquisição de estratégias para a diminuir e controlar, utilizando técnicas de relaxamento, autorregulação emocional, meditação, focagem, entre outras.
As relações familiares, amorosas e com pares são também uma dimensão importante no contexto da ansiedade, devido à sua base de influência relacional, ao nível da manutenção e expressão dos sintomas. Assim, o campo das relações pode ser também objeto de foco terapêutico (individual ou através de terapia familiar).
Alguns dos principais objetivos psicoterapêuticos passarão por aprender a: reavaliar situações indutoras de medo e pânico, de forma a encará-las cada vez menos como ameaças iminentes e mais como desafios passíveis de serem geridos; enfrentar estímulos evitados e temidos, sendo o evitamento um importante fator de manutenção da ansiedade; quando necessário, resolver conflitos mais profundos subjacentes aos sintomas de ansiedade dos quais pode não haver consciência. Desta forma, recorrer à psicoterapia para intervir sobre a ansiedade permite recuperar qualidade de vida e pode ajudar a superar a sensação de paralisação causada por esta condição, aumentando a sua sensação de autoeficácia e o seu bem-estar.
Referências
American Psychiatric Association. (2022). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed., text rev.). American Psychiatric Association.
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Wolfe, B. E. (2005). Understanding and Treating Anxiety Disorders: An Integrative Approach to Healing the Wounded Self. American Psychological Association.